Roberto Maciel (Betão)
CANTINHO DO BETÃO: A SAGA DE OSNY BAMBUZEIRO – O EREMITA parte I
Ter, 21 Fevereiro de 2023 | Fonte: Roberto Maciel (Betão)
Estradinha de terra semi-ressecada pela estiagem braba, ele cambaleava claudicando da perna esquerda. Suava em bicas, uma sudorese etílica, até que, num tropeço, saiu da estrada e se embrenhou pelo matagal, sem rumo e sem aprumo, sem largar seu facão mateiro, companheiro fiel de trabalho do ofício que escolhera pra ganhar a vida honestamente e economizar para o futuro.
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Osny Bambuzeiro, como era conhecido por seus artesanatos em bambu, sentado na varanda do rancho, bebericando uma cervejinha, só aguardava a chegada de Mané Carroceiro que levava seus artefatos para vender no vilarejo. Ia junto, papeando, relembrando as peripécias da infância e, vítima de acidente que lhe luxara um dos joelhos, Osny claudicava mas, mesmo assim, papava léguas a pé, mata adentro, em busca de seu material de trabalho, o bambu.
Casara, meio na marra com Ornela, também amiga de infância dele e de Mané. Moça prendada, boa cozinheira, a parceira ideal nos embates amorosos.
Em casa, economia máxima nos ganhos com a venda dos artefatos, tostão por tostão guardados numa burra bem escondida, até de sua querida Ornela, que ficava nas lidas domésticas enquanto ele partia em busca do material para o trabalho. Apesar da pão-durice, não faltava comida farta em casa.
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Acordou com uma língua quente lambendo seu suor etílico e, ainda meio zoró, abriu os olhos, vislumbrando o lambedor. Era um gambá. Sentou-se assustado, espantando o bicho com as mãos, mas, o gambá teimoso, só afastou-se e ficou observando o homem que tentava aprumar-se, até que encontrou um ponto de apoio colocando-se em pé.
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Ponto de apoio esse, que parecia uma fenda na morraria, assim como a entrada de uma gruta. As várias fendas no acima, deixavam entrar alguma luminosidade no interior, o suficiente para sua locomoção. Empunhando seu facão mateiro, receoso de algum bicho, foi explorando o local, bastante amplo, espaçoso. Havia até um olho d’água formando um pequeno veio onde saltitavam lambaris. Nem percebera que fora seguido pelo gambá o tempo todo.
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Osny, por várias vezes dera abrigo ao seu amigo de infância que dormia na oficina, tomavam cervejinha juntos, enquanto Ornela cuidava do rango e, logo cedinho, Osny saía em busca de seu material de trabalho, sempre acompanhado de seu fiel facão mateiro. Mané ficava na casa, ajudando na lida, capinando a grama ao redor do rancho e, à tardinha, saía em busca do amigo, voltando ambos, com a carroça cheia de bambus grossos, finos, médios, material que Osny usava em seu trabalho artesanal.
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Havia um pouco de jabá em sua mochila e, encontrando um cantinho aconchegante, lá sentou-se, matando a fome e depois, ajeitando-se, caiu no sono, acordando no romper da aurora, com o gambá enroscado em suas pernas. Espantou o bichinho que ficou a poucos metros observando a reação do homem, que lavou o rosto no veio d’água e foi para a entrada da gruta. Foi para fora, ainda esfregando os olhos sonolentos e, sempre seguido de perto pelo gambá, viu-se num cerrado de bambuzal. Mais adiante, algumas árvores frutíferas e um matagal de cipós que pendiam de algumas delas, chegando a ir até o chão. Ganhara um novo lar e um amigo. Um verdadeiro paraíso.
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Já entardecia e nada de Mané Carroceiro ir busca-lo. Estranhou pois seu amigo de infância nunca havia falhado. Não perdeu tempo e como o anoitecer já vinha chegando, fez um amarrado de bambus (ainda bem que eram dos mais finos) e foi levando-o no arrasto até o rancho onde teve a maior surpresa de sua vida. Mané, carroça, sua mulher e a arquinha onde guardava suas economias, haviam desaparecido. Lá fora, só as bostas do burro se perdiam no escuro da noite. Acendeu a lanterna e foi até a oficina, mas não notou a falta de nenhuma de suas ferramentas. Foi como se sentisse dois galos na testa: sua amada e seu melhor amigo haviam lhe ornado com um belo par de chifres.
Desde então Osny se perdera na cachaça, coisa que não fazia desde o dia em que se amancebara com Ornela. Tanqueava duro e dormia largado na varanda do rancho, sem coragem de se deitar na quele leito em que tantas noites de amor selvagem fizera com ela.
O dono do bolicho onde comprava seus mantimentos e, de vez em quando tomava uma cervejinha e um trago de quebra-gelo, estranhou seu comportamento. Um dia Osny acabou se abrindo com o bolicheiro, prometendo fazer de tudo para ajuda-lo a sair do sufoco. Arrumando-lhe algumas empreitadas, já que Osny, além de artesão, fazia empreitadas de roçado, serviços de pedreiro, etc. Mas, Osny, com o pouco que ganhava com as capinadas em terrenos, torrava tudo em cachaça, chegando a sair rastejando do bolicho, até que em uma tarde ensolarada, perdeu o rumo de casa, embrenhando-se mata adentro, só acordando nas proximidades de uma gruta, com um gambá lambendo-lhe o suor etílico da fronte.
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Osny voltou ao rancho por algumas vezes e, aos poucos, baldeava suas ferramentas para a caverna onde vivia com seu amigo gambá.
Encontrou na oficina um pequeno cofre onde economizava um orçamento secreto e uma bicicleta velha. Afastou tudo para a nova morada e tacou fogo no rancho, procurando deixar entre as cinzas seus momentos de felicidade e desgraça.
*AGUARDEM, NA PRÓXIMA SEMANA, A PARTE FINAL DESTA ELETRIZANTE SAGA. BOM CARNAVAL A TODOS.
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