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Gregório José

O ABRAÇO QUE FALTOU

Qua, 08 Maio de 2024 | Fonte: Gregório José


Era uma vez um homem que dedicou sua vida ao trabalho. Dias longos, noites infindáveis, tudo para garantir o sustento de sua família. Os filhos cresceram, formaram-se em Direito, Odontologia e Medicina. O pai, com orgulho, viu-os trilhar seus caminhos, conquistando diplomas e títulos. Mas o tempo não foi gentil com ele. A esposa, sua companheira de tantos anos, partiu, deixando-o viúvo e solitário.

Agora, envelhecido e fragilizado, o pai vive em um asilo popular. O quarto é pequeno, compartilhado com outro morador. O conforto é escasso, e as lembranças da família são seu único refúgio. Ele relembra os tempos em que todos viviam juntos, as risadas à mesa, os abraços apertados. Mas agora, os filhos estão ocupados demais com suas próprias vidas.

Os anos passaram, os filhos cresceram e seguiram seus próprios rumos, deixando para trás um pai orgulhoso, testemunha silenciosa de suas conquistas acadêmicas e profissionais. Mas a vida, invariavelmente, reserva seus desafios mais duros, e a partida da esposa deixou o pai solitário, carregando nos ombros o peso da ausência e da idade.

No entanto, a vida segue seu curso, implacável em sua marcha inexorável. Os filhos, mergulhados em suas próprias agendas, parecem distantes demais para perceber a solidão que consome o coração do pai. Postam fotos de viagens, encontros com amigos e sorrisos falsos nas redes sociais. Seus cães de raça, criados com mimos e cuidados, consomem milhares de reais por mês em petshops e cuidadores. Enquanto isso, o pai, que só queria um abraço, está ali, esquecido, à mercê das lembranças e da solidão.

O velho senhor teve um AVC, e suas pernas já não o sustentam como antes. Ele observa a vida lá fora pelas janelas do asilo, vendo o mundo passar sem tocá-lo. Os filhos visitam ocasionalmente, mas o abraço que ele anseia nunca chega. Talvez eles não percebam a falta que faz, ou talvez estejam ocupados demais com suas próprias preocupações. Em um mundo dominado pela superficialidade das redes sociais, onde fotos e sorrisos são postados com a mesma facilidade que são esquecidos, o verdadeiro afeto parece se perder nas entrelinhas da vida moderna.

Enquanto isso, o pai espera. Espera pelo abraço que nunca vem, pelo carinho que se perdeu nas obrigações da vida adulta. Ele não pede muito, apenas um gesto de afeto, uma demonstração de que ainda importa. Mas os filhos seguem em suas rotinas, alheios à solidão do velho pai.

E assim, ele vive, entre lembranças e silêncio. O asilo é seu mundo agora, e as paredes testemunham sua saudade. Os filhos, com suas vidas movimentadas, não percebem que o tempo está se esgotando. Um dia, talvez, eles olhem para trás e se arrependam. Mas o abraço que faltou já terá se perdido nas entrelinhas da história. Talvez um dia, quando a solidão se tornar insuportável e as lembranças se transformarem em sombras distantes, os filhos despertem para a falta que fizeram. Talvez então compreendam que o tempo é um recurso precioso, que não pode ser desperdiçado com trivialidades enquanto o amor espera do outro lado da porta.

Muitos trocam os passeios com os pais, as visitas nos finais de semana, os almoços em família por uma volta na praça, no parque, na lagoa com o cãozinho de estimação. Muitos fazem carinhos nos bichinhos de pelo e gritam com os genitores. Deslizam os dedos nos celulares em páginas de desconhecidos e não fazem um afago nos cabelos brancos dos pais.

Que esta crônica sirva como um lembrete: abracem seus pais enquanto podem. Não esperem que a solidão os alcance para perceber o valor de um simples gesto de carinho. Afinal, o tempo é implacável, e o abraço que deixamos de dar pode se transformar em uma eterna ausência.

Correio de Corumbá

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