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Roberto Maciel (Betão)

CANTINHO DO BETÃO: REENCONTRO

Dom, 26 Março de 2023 | Fonte: Roberto Maciel (Betão)


Cansado de ficar em casa por causa das mudanças bruscas do tempo, hoje resolvi dar uma esticada e sair em campo. Peguei minha bengala, companheira de caminhada e peguei rumo. Em pouco tempo estava chegando ao meu destino: O Boteco e Casa de Eventos de Gilson Cara de Bode, personagem do artigo anterior. Sei lá, mas parece que um passarinho piou em meus ouvidos e eu lá estava e, logo ao chegar notei uma carroça muito conhecida minha e um burrico atrelado nela.    

O proprietário do bar, mesmo antes que eu começasse a galgar os degraus da escada, veio ao meu encontro: - Nós só estávamos à sua espera pra prestigiar esta tocata de hoje. Dizendo isso, conduziu-me a uma mesa meio afastada, mas num ponto bem estratégico, de onde se podia apreciar todo o movimento. – Tem alguém a sua espera naquela mesa.    

Parece que eu estava adivinhando o que ou quem me esperava lá, quando vislumbrei uma dentadura branca mergulhada num copo de cachaça. Era aquele preto safado do qual eu sentia muito a sua ausência; Seo Nhonhô, que logo apareceu pois tinha ido dar um mijão e vinha enxugando as mãos na calça foló que gostava de usar quando ia nas tocatas e bailes, só para deixar o “passarinho” mais à vontade.
- Oi, Seo Moço. Ieu tava cum sodade de ti vê pessoarmente – Disse ele, abraçando-me efusivamente.
- Eita Preto Velho, porquê você sumiu? Nunca mais apareceu lá em casa...
- Quar o que, Seo Moço pois toda veiz qui mecê se assenta pra iscrivinhá naquela maquininha, ieu to di seu lado, só soprano na sua oreia. – toda veiz qui ocê si assenta na garage pra mode toma sua pinguinha, ieu ativo sua imaginação prum novo iscrito.
- Putaquipariu, amigo, é que eu ando meio zabo-zabo das ideias por causa da veieira...
- Isquenta não, Seo Moço, bamo curti a noiti, dançá um chamamé i umas porca, paraguaia, pois quem vai tocá nesta noite é um conjunto paraguaio, lá da colônia paraguaia i uns convidado ispeciar di Curumbá...
- Di cumilança vai tê caribéu i sopa paraguaia. – Já mandei trazê nossa cervejinha i agorinha memo o Gaudêncio Trovoada ta chegano com sua sanfona i vai si assentá na nossa mesa. Truxe inté um tampão di oreia procê.
- Um por de sol maravilhoso anunciava o final do entardecer e o cair da noite enquanto Gilson Cara de Bode dava as últimas ordens aos garçons e aos ajeitadores do palco e recomendou que desligassem o microfone do Gaudêncio Trovoada quando ele fosse cantar uns vaneirões.     

A freguezada começava a chegar e ocupar as mesas, tanto fora quanto dentro, deixando espaços para o arrasta-pé, enquanto o conjunto afinava os instrumentos. Foi então que ele chegou em sua charrete e desceu com sua sanfona, dirigindo-se à mesa onde eu e Seo Nhonhô estávamos; - Vinha de bombachas, camisa branca e lenço vermelho no pescoço, acenando para todos, e, se eu não tivesse colocado os tampões nos ouvidos, meus tímpanos estariam vibrando até hoje.    

Os copos para as cervejas eram de alumínio, mas, mesas próximas à nossa assim, como as garrafas eram servidas em “camisinhas” do mesmo material.
- Hoje vou esquecer meu churrasco e provar a iguaria de sua terra – disse Gaudêncio, dirigindo-se a mim. É sempre bom degustar cozinhanças de outras regiões. Já degustei muitos pratos daqui, pois temos várias comunidades nos arredores, mas, não deixo de apreciar uma bela costela gorda pra ensebar o bigode.     

A cervejada rolava à solta quando Gilson Cara de Bode foi até o microfone e anunciou: - Hoje nossa tocata é em homenagem ao criador de todos os personagens desta história: - O nosso amigo Betão, articulista do Jornal Correio de Corumbá, em comemoração ao seu aniversário transcorrido no dia 4 passado; - Sanfoneiro, puxa o fole e lasca um chamamé rasgado em homenagem ao aniversariante.    

Em meio aos aplausos o sanfoneiro rasgou o fole e o limpa-banco começou. Lá fora a poeira levantava e na parte coberta, o toc-toc das botas ecoavam pelo salão. Seo Nhonhô logo se atracou a uma paraguaia e saíram rodopiando salão afora enquanto ecos chamamezeiros estridenteavam das mesas ainda ocupadas e dos dançarinos.   

Seo Nhonhô voltou à mesa arrastando a dama, pegou a dentadura e sumiu no salão pois, afinal, não ficava bem chegar banguela numa paquera. A festança foi até ao raiar do dia, com a participação do conjunto dos corumbaenses e culminando com os vaneirões do Gaudêncio Trovoada e sua sanfona.

ACORDEI COM A CONSORTE ME CHAMANDO, DIZENDO QUE IA DAR UMA CHEGADA NA CASA DE DOIA E LOGO JÁ VIRIA PARA FAZERMOS A POLENTA PARA O ALMOÇO.

Correio de Corumbá

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